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Alívio das Lágrimas

  • Foto do escritor: Michel Luiz
    Michel Luiz
  • 2 de jun.
  • 6 min de leitura

Atualizado: 3 de jun.

Ou como um antigo ocultista antecedeu as neurociências e as psicologias de Freud e Jung.

Por Michel Luiz, Junho de 2025.


Recorte e edição de ilustração idealizada e executada por Éliphas Lévi - 1856 em "Dogma e Ritual de Alta Magia".
Recorte e edição de ilustração idealizada e executada por Éliphas Lévi - 1856 em "Dogma e Ritual de Alta Magia".

"Choro e ranger de dentes" é o que resta para aqueles que se entregam as trevas da ignorância. Em uma livre observação sobre os processos de identificação com atos de infringir e fazer o mal à qualquer outro ser vivo, inicia o capítulo V, da obra "Grande Arcano", de Éliphas Lévi, ao filosofar sobre "As Trevas Exteriores".


Nessa obra publicada pela primeira vez em 1868, o autor identifica os efeitos morais que recaem sobre o mito de Édipo Rei, antecedendo Sigmund Freud em 29 anos, quando este envia em carta para Flies - seu correspondente de época - discutindo sobre sua "observação do fenômeno edipiano" que surgiriam em sonhos. Freud fica famoso com essa observação e competência no tratamento de neuroses após sua publicação em 1899, com o título de "A Interpretação dos Sonhos" e formulando o complexo de édipo em 1910.


Todavia, essas datas servem apenas para demonstração do que viria a inundar o imaginário de milhões de pessoas sobre a organização psíquica humana. Vejamos o que irá interessar aqui: as observações do ocultista que fora deixado nas lacunas da história por ser um padre místico que não buscava agradar católicos, intelectuais das ciências e muito menos praticantes de magia cerimonial e/ou feiticeiros de sua época.


Éliphas Lévi dizia que a inteligência nasce do Saber em harmonia com a Crença. O Saber é quem fecunda a Fé e sem sua "expansão" como contrabalanço da "restrição" da crença, produziriam apenas "abortos monstruosos e fantasmas". (Lê-se também o uso da palavra "fantasmas" nas obras de Freud, quando este se refere às "imagens sobrepostas das fantasias em suas neuroses obsessivas"). Éliphas ainda traça o entendimento de que sem a Fé como objetivo final do Saber se reproduzir e se manifestar no "dar a Luz seus filhos e filhas da natureza intelectual"; o conhecimento cai em "desânimo profundo".


"Melancolia" - Albrecht Durer, pintor renascentista alemão (1471-1528)
"Melancolia" - Albrecht Durer, pintor renascentista alemão (1471-1528)

Éliphas então deflagra que as pessoas em suas crenças que reagem contra a Natureza e o conhecimento científico dela, assim como cientistas que abominam os conceitos que levam ao entendimento fisiológico sobre a fé; são igualmente inimigos da Luz. Essas observações já dariam para traçar paralelos com o psiquiatra Carl G. Jung, quando este aponta para uma psicologia da integração e equilíbrio de "opostos complementares", em sua vasta obra; assim como os apontamentos do surgimento do desânimo e angústia provocados pelo desequilíbrio dos fenômenos psíquicos de anima e animus. Mas nos concentremos na poética sobre as Lágrimas trazidas pelo ocultista E. L.


"O fanatismo dos ignorantes" gera a tragédia moral humana, pois "se danam uns aos outros", sem compreender que há uma colaboração em suas diversidades de expressão. O fanático não se apercebe da razão contida na Fé e que a superstição é um engano. Na dissolução do ódio e sua ignorância, operam as manifestações do Amor, mas aqueles que se afastam do recíproco acolhimento da Graça e sua gratuidade, lhes restam o choro angustiante. Observando uma "visão" de Santa Tereza, E. L. faz um paralelismo dialético entre a Alma e Édipo. Atribuindo das palavras de Jesus sobre "As Trevas Exteriores", o ocultista diz para imaginarmos uma alma que, por ódio da Luz, se torna cega como Édipo. A cegueira é um tema recorrente nas correntes gnósticas, orientando sobre o potencial de nossa ignorância e não sobre a cegueira física de uma pessoa com deficiência.


Essa alma é "lançada para fora dos mundos" e "da clareza dos sonhos". Fica solitária na escuridão profunda e se mobiliza nas sombras, sendo esmagado os pensamentos e raciocínio "eternamente". Seu sofrimento neste abismo é "capaz de encher o infinito".


"Velho Guitarrista" - Picasso, pintor espanhol. 1881-1973
"Velho Guitarrista" - Picasso, pintor espanhol. 1881-1973

"Ó dor... Dor... Ter podido compreender e ter se obstinado no idiotismo de uma fé insensata... Ter podido amar e ter atrofiado o coração...

Ó! uma hora somente? Apenas um minuto! Um minuto apenas! das alegrias mais imperfeitas e dos mais fugitivos amores...

Hmm... Um pouco de ar e um pouco de Sol! Ou ao menos um luar, com um tablado para dançar...

Uma! Uma gosta de vida! Ou menos que uma gota.

Uma lágrima..."


E a Eternidade implacável lhe responde:


"Como falas tu de 'lágrimas', se nem mesmo podes chorar...

As lágrimas são O Orvalho da Vida* e a destilação da Seiva do Amor.

Tu te exilaste no egoísmo e te fechaste na morte.

Ah... quiseste ser mais santo que Deus!

Ah... cuspistes no rosto da Senhora, vossa Mãe: A Divina Natureza...

Amaldiçoaste a ciência, a inteligência e o progresso...

Ah! Acreditaste que para viver eternamente, era preciso assemelhares a um cadáver...

E dissecar-se como uma múmia.

Ei-vos-tais como vos fizestes! Gozai em paz com a eternidade que escolhestes.

Porém, não. Pobres pessoas a quem chamaste pecadores e malditos. Irão salvar-vos.

Aumentaremos a luz e iremos furar vossa parede.

Arrancar-vos-emos de vossa inércia. Num enxame de amores, ou

Se quiserdes, uma legião de anjos que são feitos da mesma maneira.

Notareis em vão como Mefistófeles, no melodrama de Goethe.

A pesar disso, a pesar de vossas disciplinas e vossos rostos pálidos,

Vós revivereis, amareis, sabereis, vereis...

E sobre os restos do último convento, vireis dançar conosco a 'roda infernal' de Fausto!

Felizes no Tempo de Jesus são aqueles que choravam!

Felizes agora os que sabem rir, porque rir é próprio da humanidade!

Como afirmara um grande profeta da renascença, o riso é a indulgência.

O riso é a filosofia! O céu se acalma quando há sorrisos.

E o Grande Arcano da Onipotência Divina não é mais do que Um Sorriso Eterno!"


Edvard Munch - "Moonligh" (1863-1944)
Edvard Munch - "Moonligh" (1863-1944)

Essa contemplação sobre o Grande Arcano transmitido por E. L., também pode ser arremetida ao "dizer sim à vida", tão discutida pelo filósofo Nietzsche ao longo de suas obras. A pesar de cravar as pás que desenterram a verdade, como marteladas pessimistas sobre a natureza humana, Nietzsche se ocupava também em retirar dessa arqueologia da alma, os tesouros enterrados no solo do ressentimento. E seu profeta Zaratustra pregava sempre sobre esse dizer sim à vida, ao afirmar que devemos superar nossos ressentimentos e observar o quão perdemos nossas capacidades de sorrir e dançar. Aqui sim estão as chaves para o entendimento filosófico de Dionísio, trazidos pelo filósofo.


*Logo nas páginas que introduzem a obra "Psicologia do Inconsciente" - Obras Completas, vol. 7/1 - C. G. Jung aponta para os processos de adoecimento das pessoas estar para um "padecimento da alma", negados pelas especializações médicas que buscam compreender um sistema mecânico e biológico do corpo. Jung percorre o tema sobre os fenômenos da psique até deixar mais algumas dúvidas sobre os afetos, planos eróticos e energia psíquica (ou libido). Ele argumenta que amor é algo cujos os conceitos são vastos, indo aos "céus e ao inferno", onde se conjugam bem e mal, nobreza e baixeza. Questões sobre o amor, a melancolia, a tragédia e também a capacidade de redenção são fortemente presentes na história. E estes mecanismos psíquicos em assimilação ao instinto de sobrevivência e liderança grupal, guiam as escolhas que alteram rotas inteiras dos fatores históricos que nos trazem até aqui. Mas isso é tema para outro momento.


[Adendo editado em 03/06/2025] - Na obra citada acima de C. G. Jung, ele apresenta uma observação sobre o sofrimento e sua transformação em lágrimas e afetos, distinta das demais medicinas oferecidas em tratamentos de sua época. Aqui está onde o ocultista pode ter evidenciado algo anterior as neurociências. A Neurociência tem colocado em prática a superação da superstição racionalista das últimas décadas sobre o chorar. Durante muito tempo acreditou-se que a humanidade só poderia evoluir alcançando os planos racionais e científicos metodológicos. Como se as ciências fossem a grande salvadora da ignorância humana. Todavia, essa busca pelo racional se tornou algo da racionalização em nosso dia a dia. A cultura moderna tende a subjugar os processos emocionais e seu rompimento em choros, prantos e outras angústias, tão naturais à mente e cérebro, quanto o desejo pelo conhecimento dos mistérios da natureza.


Ainda é muito comum ouvir tanto na vida normal, quanto no ambiente clínico sobre a raiva das pessoas, quando estas entram em prantos diante de outras pessoas. Claro que devemos ter uma observação sincera se esse choro é algo manipulador para voltar as pessoas ao redor para si, ou se o choro parte de angústia, ou de apreciação e contemplação da natureza real (a tal felicidade ou alegria). Porém está cada vez mais claro que o processo das lágrimas vai para além de uma simples limpeza dos olhos: o chorar auxilia intensamente os processos de equilíbrio homeostático de todas as vias cerebrais e como a energia psíquica passa a compreender melhor a realidade da vida!


Que possamos cada vez mais chorar por nossas tristezas e alegrias também!


Obrigado por ler!

Autor do artigo: Michel.
Autor do artigo: Michel.

 
 
 

2 commentaires


Babi Teixeira França
Babi Teixeira França
02 juin

Equilíbrio entre o saber e o acreditar. Sem equilíbrio, não há mundo de regeneração.

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Michel Luiz
Michel Luiz
03 juin
En réponse à

Essa é a "razão" do ser! Obrigado minha querida!

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