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Foto do escritorMichel Luiz

Breve resumo sobre “A Tipologia de Jung – Ensaios sobre Psicologia Analítica”

Livro de Marie-Louise von Franz e James Hillman (2ª ed. 2016)



Von Franz aponta que a melhor pergunta para se fazer quando quer descobrir

seu próprio tipo psíquico é “o que eu mais costumo fazer?”. Pois mesmo um tipo

extrovertido acredita ser introvertido e preocupado com sua mente, ou sonhos.

Por mais que este tipo se interiorize um minuto ao dia, aquele mísero minuto é o

que importa, pois se sente mais perto de si mesmo. Talvez deveríamos

perguntar: qual sua maior aflição? Onde está seu maior sofrimento? Onde se

sente diante do maior obstáculo de sua vida?

Essas perguntas apontarão para a função inferior que retornarei posteriormente

neste resumo. Sabendo do tipo inferior, será mais fácil analisar quais tipos

superiores foram desenvolvidos. A pesar de que von Franz também aponte que

duas funções superiores podem ser desenvolvidas tão bem quanto é difícil dizer

se um tipo é pensativo intuitivo ou um tipo intuitivo com pensamento bem

desenvolvido, por ambos se equipararem. Daí que ela sugere a questão: a

pessoa sofre mais com obstáculos advindos dos fatos da percepção ou dos

problemas sentimentais? Assim podemos direcionar qual a primeira e qual a

segunda função bem desenvolvida, ou superior.


E é claro que isso não funciona como um joguinho onde poderemos

compreender de forma espontânea nossos tipos. Requer análise pessoal ou

psicológica para revelar essa investigação. Porém saber os tipos e funções nos

ajudam a direcionar melhor nossos conflitos para resoluções interpessoais, ou

seja, nas relações do dia a dia, na compreensão de si e dos outros.

Von Franz então dá suas considerações gerais do problema de assimilação da

função inferior, onde parte da formação da consciência na primeira infância a

partir do inconsciente. O inconsciente é um fato primário e a consciência é

secundária, ou seja, a totalidade do inconsciente e a estrutura da personalidade

precedem a personalidade que denominamos o nosso eu, ou o ego.

Um erro que cometemos é de acreditar que podemos elevar a função inferior

como se pescássemos um peixe de um rio turbulento. E assim poderíamos

educa-la para adquirirmos um poder do inconsciente ou dos arquétipos

anteriores a nós. A função inferior é quase integralmente ligada ao mais profundo

inconsciente e o que podemos tomar de empréstimo de sua força surgem nos

sonhos ou quando conseguimos assimilar algum aspecto sombrio ou sentir seus

efeitos nas irracionalidades do dia a dia. Mas apenas até aí que conseguimos

observá-la passar em nossas vidas e perturbar nosso comportamento. Nunca

iremos doma-la como se fosse um animal próprio para a domesticação.


Há também um aspecto muito positivo no campo da função inferior: uma grande

concentração vital! Quando esgotamos a função superior ou esta estagna, a

função inferior é capaz de repor essas energias através de novos potenciais de

vida, estimulantes, como se renascesse e desejasse ser uma nova pessoa!



Ela também tem um aspecto de inadaptação, como pessoas idosas

acostumadas sempre a exercer um certo tipo de trabalho, ao se aposentar elas

se sentem muita das vezes desamparadas, tendendo à depressão por não

reencontrar novas potências de ser que renasçam de seu inconsciente. Assim

acabam adquirindo um habito de ocultar sua personalidade inferior com uma

pseudorreação substituta. Por exemplo, um tipo pensativo muitas vezes não

expressa normalmente seus sentimentos (o extrovertido), ou não compreende

os sentimentos das pessoas com quem convive (o introvertido). Quem o observa

por fora o considera uma pessoa fria e insensível. Quando a verdade é que não

conseguem expressar os sentimentos ou expressam em momentos que

esgotam essa energia antes de poderem se amostrar para os próximos.


O mesmo erro é acreditar que o tipo sentimento não pensa, quando este tipo tem

constantemente pensamentos profundos e genuínos. Mas estes pensamentos

não se modulam de uma forma que o tipo sentimento consiga expressar de sua

maneira quando fala ou escreve. Durante um exame o pensamento foge, mas

quando chega em casa o pensamento desobediente reaparece em ideias.

A vida moderna não tem misericórdia com estas funções inferiores e isso nos

leva a dissimular reações não-genuínas. Tomam as reações do coletivo,

banalizando quando são interpostos para apresentar um pensamento ou um

sentimento nos momentos de pressão. Fazem uma mescla de frases-já-ditas ou

expressões comuns apreendidas ao longo da vida para facilitar quando

defrontados a mostrar algo que não é típico de suas funções superiores. E o

mesmo se aplica aos intuitivos, cuja função inferior seria a sensação, onde

apenas seguem os modos convencionais de lidar com a sociedade.


Em alguma situação o intuitivo precise usar sua função inferior da percepção:

sente-se atraído pela ideia de esculpir, modelar, trabalhar com as mãos em

alguma arte, exteriorizando seu propósito intuitivo com algum material concreto.

Ao realizar sua arte ainda de forma infantil, talvez, sentem que algo cresceu em

seu interior, mas de súbito a intuição afirma: “isto deveria ser ensinado à todas

as pessoas, em todas as escolas!” Então se voltam para a intuição e pensam em

todas as possibilidades de estudos da arte que a humanidade desenvolveu, de

sua composição, acreditando até mesmo que isso seria a chave do

conhecimento da divindade que salvará a todos. O intuitivo introduz um mundo

inteiro, deixando de considerar apenas o prático que era produzir sua arte. A

função principal delira, saindo do seu contato com a terra e novamente voltando

para o abstrato ar das ideias futuristas...



Von Franz também aponta para o inverso, quando a função inferior invade a

superior e a falsifica de algum modo. Um exemplo apresentado é no tipo

perceptivo (ou sensorial). Este tipo costuma ser excelente em sua relação com

o movimento material, tais como dinheiro e trabalho. Contudo há o exagero

inevitável em alguns momentos da vida: imaginam possibilidades sombrias onde

poderia sofrer um acidente, ou despertar sua alma utilizando de métodos

obscuros que chegou para si em algum anuncio.


Assim ou tem medo de ser incapacitado do trabalho e passa a empilhar dinheiro

e objetos sem uso como um acumulador, ou gastam fortunas em

pseudossoluções fajutas que nunca dão um descanso para esta pessoa,

entrando no prejuízo financeiro e muitas das vezes falindo. A intuição inferior

negativa está para as possibilidades ruins. Neste mixtum compositum

neurótico de tipos que não conseguem mais exercer sua função superior, há um

estágio de transição onde conhecer bem o próprio tipo psíquico poderá evitar

estes fenômenos desgastantes e trabalhar bem sua própria vontade.

Von Franz também aponta para o desenvolvimento da percepção que dá certo

sentido da realidade e a intuição como capacidade de antecipar um problema

para não agir tão desavisadamente. Não há campos intermediários de apoio,

mas se a análise psicológica puder levar ao desenvolvimento de suas funções

de apoio, poderá vencer a dificuldade com as funções intermediárias. A mestra

refere é bom ter em mente de que jamais deverá passar diretamente para a

função inferior, pois a vida fará isso normalmente, pois os aspectos biológicos

da mente são indiferentes às nossas capacidades cognitivas.


Em suas respostas para uma entrevista, Von Franz diz também sobre a fuga da

análise, onde frequentemente artistas pensam que se analisados irão educar sua

função inferior e perderão assim, sua criatividade. Isso é impossível, pois mesmo

que o analista seja estúpido o bastante para tentar fazer isso, não conseguirá. A

função inferior é como um cavalo indomável. Pode ser subjugado tanto quanto

não fazemos coisas estúpidas o tempo todo, como dizer à fera: “eu não fustigo

você se você não me derrubar”. Isso é o máximo que se pode conseguir com a

função inferior, nunca a governar ou educa-la, mas com inteligência de ceder,

poderá organizá-la de forma que esta não lhe derrube em momentos ruins.

Aquilo que é inconsciente para ambos os aspectos extrovertidos/introvertidos

não aparece em projeções externas. Aos extrovertidos poderá o inconsciente se

manifestar como uma visão ou fantasia, de forma ingênua, porém genuína,

levando a sério essa contemplação do mundo interno. Porém quando o

extrovertido extroverte sua intuição como um prêmio, arruínam tudo, mas se não

estragarem a introversão com a vaidade, pode-se observar uma conduta mais

real do que com introvertidos diante seu inconsciente.


Ao introvertido que se acorda para sua extroversão inferior, poderá espalhar o

calor da vida em um verdadeiro festival simbólico melhor do que qualquer

extrovertido. Dando vida profunda em significados e sentimento vital, semelhante

a magia. Se um introvertido consegue pôr para fora sua extroversão inconsciente

de maneira adequada, poderá criar uma atmosfera simbólica como uma

comunhão ou um rito consagrado. Entretanto vale lembrar que a maioria das

pessoas escondem seu lado inferior com pseudoadaptações, pois temem serem

julgados pela sociedade e por si mesmas naquilo que se denomina falsas

crenças, ou o Eu inferior e infantil que está no domínio dos medos da vida adulta.




Resumo por Michel L. C. Araújo – Abril de 2024.


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