ZOROASTRO – Resumo da Cosmogonia e Evolução da Religião Solar
- Michel Luiz
- 18 de jan.
- 10 min de leitura

Entre a Mesopotâmia e a região Indo (Ásia Central), nos povos indo-iranianos, surge um movimento religioso de práticas éticas, das quais influenciaram diversas religiões pelo mundo. A qual também evoluiu a partir de influências culturais dos povos que ali estavam, tais como hindus (Índia do Norte), persas e provavelmente egípcias. Esse povo foi conhecido como “povos arianos”, os antecedentes dos povos iranianos e, posteriormente, hebreus e persas. Os povos arianos tinham o dialeto chamado “medas”, o qual evolui para a palavra Média.
Neste povo houve ali uma pessoa chamada Zoroastro, o qual pode-se dizer ter sido o primeiro profeta que afirmava ter dialogado diretamente com o UM, o “Deus Único”. Afirmava dentro de um henoteismo de que havia uma única origem criadora, da qual derivaria todas as outras divindades e emanações divinas. Aqui talvez esteja a lacuna com uma antiga tradição egípcia, da qual também encontra-se uma fonte originária do Cosmos, a qual chamavam de PTAH, ou PTHA. Mas isso é uma mera especulação. As fontes históricas apontam para a existência de Zoroastro sendo provavelmente de 2 milênios antes de Cristo e com forte presença até o segundo século antes de Cristo. Mas a mensagem do Avesta (os hinos da Glória Divina e diálogos de Zoroastro), tem sua recorrência há mais de 3000 anos antes de Cristo, o que pode confundir a possível existência desse profeta.
Em um trabalho de aprendizado sacerdotal comum de sua época, Zoroastro recebe mensagens de Ahura Mazdā, algo como “O Senhor Sábio” em livre tradução. Zoroastro compões seus hinos em uma linguagem chamada Gathas, sendo restritos dentro dos Yasnas em sua composição do Avesta. Esse Avesta Gático e o Novo Avesta, das línguas descritas dos hinos, são “parentes próximas” da linguagem conhecida como Sânscrita. Daí surge o “Ariano Védico” e o “Ariano Sânscrito”, esse último tem um significado como “algo cultivável”, a “cultura” que é transmitida. Incluindo o nome secreto de Ahura Mazda, Varana, se encontra no hindu pela palavra “Varuna”. Mas a escrita mesmo só veio a se originar quando o império Persa começou a expandir, por volta de 500 anos antes de Cristo. Essa escrita universal era conhecida como Aramaica, essa que conhecemos atualmente como sendo a origem de diversas escritas, tanto dos povos hebreus, quanto da cultura helênica e iraniana. O aramaico era próximo das línguas semíticas, dos povos cananeus que posteriormente evolui para a língua hebraica.
Essa escrita tem uma evolução interessante, advinda da escrita cuneiforme de quando os persas absorvem a cultura babilônica. Toda essa mescla cultural tem sua importância, devido as origens do conhecimento ético e estético adotado por diversas religiões que tomam os modelos psicológicos atuais da cultura humana em geral. Com a invasão helênica promovida por Alexandre, grande parte das escrituras zoroastrianas se perderam. Sendo preservadas somente após a conquista dos Parthian (Partas), os antecessores dos povos romanos.

Após esses períodos de invasões e mesclas culturais, houve o período Sassânida, onde o zoroastrismo teve seu maior vigor religioso, num período mais ou menos entre 224 e 661 d.C. O zoroastrismo era conhecido como religião Masda, ou Masda Yasda, sendo a primeira religião organizada com escrituras consideradas sagradas. Nesse período sassânida, os religiosos do masdaismo também perseguiam infiéis e nas disputas sacerdotais, houveram conflitos e guerras entre estes e os cristãos armênios. Por outro lado, uma ramificação do zoroastrismo que conviveu bem com os protos cristãos foi o maniqueísmo, advinda do profeta Maní, que criou algo que juntara as práticas místicas do judaísmo, gnósticos, do mitraísmo e outros conhecimentos.
Uma das características do zoroastrismo que ficou presente nas diversas culturas religiosas, era a da guerra entre a Luz e as Trevas, sendo a primeira representada pelo Ahura Mazda e a segunda, por Angra Mainyu (ou Arimã). Esse último é dito ser criado por Ahura Mazda, mas que se possuiu pelas trevas e cegava os homens com a ignorância e as tentações. Angra Mainyu se rebelara contra o UM, por estar obcecado em firmar sua própria criação, o Druj, algo como “o caminho da perversidade e do mal”; em oposição ao caminho da retidão de Ahura Mazda, o “Asha”. No zoroastrismo também se percebe a inversão dos Deuses hindus (védicos) benignos, os Devas, como entidades que seguem o Druj. Talvez até mesmo no contraponto entre o nome Ahura com os Asuras védicos; os quais não são de todo entidades malignas, mas com o passar do tempo, foram mais associados aos fenômenos prejudiciais.
Zoroastrismo, mais conhecido como Zaratustrianismo em livre tradução da literatura internacional, também apresenta os Yasatas, uma configuração das divindades menores que auxiliam como mensageiros do caminho de retidão Asha. Entidades mensageiras da palavra divina, sabemos que tem sua evolução no conceito de anjos, na religião hebraica e posteriormente, no cristianismo. Na História sabe-se que após os anos de escravidão babilônica que os clãs de cananeus sofreram – os ancestrais dos hebreus – foi no império de Ciro que puderam se libertar. Tanto que encontramos seu nome original, Kūruš, como o único não judeu que consideram um messias. Ora, Ciro além de dar liberdade para os ancestrais dos hebreus, ainda financiou a reconstrução dos templos destruídos por seus invasores anteriormente.
O conceito monoteísta surge na Torá apenas no livro de Isaias, livro este justamente escrito historicamente durante e/ou após o período do império persa de Ciro. Na bíblia vulgar, encontramos o versículo em Isaias 44:6, onde diz “Eu Sou O Primeiro e Eu Sou o Último; além de mim não há outro deus”. Enquanto nos livros anteriores, encontramos citações referentes a não cultuar outros deuses se não o Javé – YAHWEH - (יהוה). Outra influência do zoroastrismo está na crença da ressurreição física dos mortos, presente tanto no judaísmo ortodoxo, quanto no cristianismo “apocalíptico”. Bem, em meio aos tantos conflitos e guerras, essa crença ser difundida para as famílias em luto diante dos massacres coletivos, traria um certo conforto. Até que virasse uma lei sacra..
Zoroastro traz o conceito de Amesa Espenta (Amesha Spenta), os “Imortais Sagrados”, algo como as 7 emanações de sabedoria de Ahura Mazda, capazes de dissolver as trevas e conduzir os “escolhidos” do caminho do bem, para a Luz. Mas nesse conceito de escolhidos, não se dizia que apenas os zoroastristas seriam salvos, porém todos os que seguissem um caminho benévolo. Até o império sassânida, o zoroastrismo não pregava nenhuma intolerância às religiões politeístas ou acéticas. E nos hinos de louvor, onde perguntas são feitas por Zaratustra para compreender através das mensagens de Ahura Mazda, o que a humanidade deveria realizar para se conduzir para o caminho do bem, vemos coisas do tipo: o fim do sacrifício de animais ou pessoas para a oferenda aos deuses; a plena devoção no caminho da retidão; ritos de água e de fogo, tais como os batismos; jejuns e meditações através do silêncio ou guiados por hinos e danças; alimentação vegetal, livre de quaisquer animais; entre outros caminhos éticos de convivência e comunidade fraterna – a compaixão com a vida.
Há quem diga que esse fenômeno religioso da busca pela retidão e benefício da natureza, influenciara também o surgimento das meditações sobre o TAO. Já que o Zoroastro é algo ou alguém que teria manifestado suas observações há mais de 3 ou 4 mil anos atrás. Outra observação que se encontra no Avesta são os 12 ciclos, que são incorporados no mitraísmo como as chaves de ritos de iniciação ao Sol. Esses ciclos já eram conhecidos nos babilônicos, onde nomearam as precessões da Terra como as grandes passagens dos Eons (Aions), com o nome de animais ou seres antropomórficos de sua mitologia. Por exemplo, Touro é referido por Zoroastro com a observação da prosperidade dos povos, como também a virtude que “civilizou” os bovinos ao lhes ensinarem o arado da terra, também é uma virtude que civiliza o ser humano sobre o trabalho que o sustenta. Uma visão um de cooperação e mutualidade interessante!

Na passagem sobre os Amesha Spenta se acham os protótipos do que viriam a ser os mantras posteriores. Traduzido como Mãthra, eram canções ensinadas para Zoroastro para firmar os ensinamentos nos seguidores da retidão. Esses mantras eram diversificados, tendo atém mesmo um para a gordura, um para a doutrina salvadora, etc. O nome do profeta também é conhecido no Avesta como Zarathustra Spitama, aquele que poderá conduzir a palavra da salvação para os povos.
O livro sagrado apresenta o ato da criação, onde a contraparte das trevas forma a morte, o inverno e “a Serpente da Água”, o Leviatã que repercute em diversos mitos culturais por toda humanidade. Algo que podemos encontrar nas culturas indígenas da sudamérica e que estava presente nos preceitos de Zoroastro, é sobre como lidar com os corpos dos mortos. Na cultura Inca sabe-se que os mortos eram deixados em pedras do alto das montanhas, secando até que os condores eliminavam as carcaças. Daí então os ossos eram conduzidos para um enterro de renascimento, dentro de potes ovais que reproduzissem o útero. Essa prática não é algo asqueroso, pois essa cultura via os condores como pássaros que levavam a energia vital, ou alma, da pessoa para as alturas, de onde o Apus, algo como a divindade da montanha, acolhia sua criação.

Não muito distante disso, Zaratustra também ensinara uma prática semelhante, onde enterrar o corpo iria tornar a terra impura e o fogo ser algo sagrado, proibindo a cremação. Ele pedia para conduzir os corpos para o alto das “torres do silêncio”, onde os mortos eram expostos ao sol e comidos pelos abutres, levando a essência do corpo para as alturas.


Ahura Mazda afirma para Zoroastro que seu ensinamento havia sido transmitido para outro imortal antes dele, 600 invernos (ou anos) antes de apresentar ao profeta. O nome de seu antecessor era Yima, o grande servo chefe, que surge quando a terra está sofrendo superpopulação de humanos e rebanhos, mas não chega a ter um desfecho estilo “grande dilúvio” para solucionar a densidade demográfica e as contaminações. É dito também sobre um dos pecados que tornam a terra impura, quando há o acúmulo de sujeira, até mesmo de unhas cortadas e cabelos que se soltam quando são penteados. Há algo semelhante nos contos de Lao Tsé, quando este ensina sobre o saneamento básico para as populações orientais, apontando que o acúmulo de lixo era a fonte dos tais demônios que associavam como as doenças que contraíam.
Mas então, quais as relações sobre a construção de um ser humano transcendente, aquele que pode superar sua animalidade, podemos encontrar correlacionado nos ensinamentos de Jesus e posteriormente, dos grupos gnósticos? Talvez nos magos vindos do Oriente para apresentar louvores ao Deus encarnado? Talvez das tribos dos “Magos”? – uma tribo iraniana de zoroastrianos conhecidos por serem astrólogos, encarregados de levarem presentes dos reis para pessoas que nascessem agraciados pelo “favor” divino, ou aquilo que foi chamado de “Luz do Logos”.
Outro conceito que influencia até os dias de hoje as ciências, vem do dualismo que o zoroastrismo deu vigor. Essa visão dual auxiliou na separação e observação dos fenômenos por um lado, mas causou a diferenciação psicológica de entendimento da existência, quando nos repartimos entre mente e corpo, alma e espírito e por aí vai. Mas também construiu, a partir do entendimento do que é o bem e o que é o mal, a ética dos bons pensamentos, boas ações e boas palavras, na vivência material humana.
As formas divinas que compõe o panteão zoroatrista, encontramos estereótipos dos arquétipos recorrentes no entendimento das emanações do UM. O aspecto marcial no deus Verethragna, o deus da guerra; a deusa dos oceanos Ardvi Sura Anahira; o deus Mithra associado à ordem cósmica e à justiça, nos aspectos solares; o deus do vento Vayu; o deus do fogo sagrado Atar; e o deus da saúde e da força Haoma. Zoroastro recebe a mensagem de um mensageiro de Ahura Mazda, o “Bom Propósito”, chamado de Vohu Mahah. Desde então ele prega que os deuses cultuados não são o Verdadeiro Deus. O Verdadeiro anuncia que não há necessidades de sacrifícios de sangue, mas apenas a boa vontade para libertar o ser humano de sua condição maléfica.
Outros conceitos mais obscuros do zoroastrismo estão no início da vida de cada indivíduo, onde ao nascer o “Fravashi” – algo como espírito superior – envia a “Urvan” – algo como a Alma – ao mundo material e da experimentação. Assim a pessoa poderá exercer seu livre arbítrio e escolher entre o bem ou o mal. Os Fravashi então seriam algo como os anjos guardiões, compilados pelo hebraísmo e posteriormente, incorporado no catolicismo. Nos ritos zoroastrianos essas entidades são evocadas durante as entonações de mantras, favorecendo a proteção do caminho da retidão da pessoa que o recebe ao nascer e ao morrer.
Outros conceitos recorrentes estão nas ideias de um local de descanso até o dia do julgamento, como um purgatório silencioso; a ideia de uma casa das canções eternas, onde os bem julgados iriam, e um local das mentiras eternas, onde os mal julgados eram jogados em danação. No pós vida, após passar pela ponte que encaminha a alma e o espírito em união, haveria 4 Reinos Celestes e 4 níveis de infernos subterrâneos. Mas é dito que mesmo aquele que é jogado ao nível mais inferior e infernal das trevas, não ficaria ali eternamente, pois Ahura Mazda é benevolente demais para deixar tais almas em castigo constante. Um salvador viria ao resgate das almas perdidas, o “Saoshyant”, ou “aquele que traz o benefício”, para iniciar o fim dos tempos. Nesse dia final, Arimã seria por fim destruído.

Da Água advém a Sabedoria, do Fogo, a purificação. Do Ar a permanência e da Terra o entendimento. Assim a correlação dos Elementais surgiam e se firmavam no entendimento de mundos (Elohim) e elementos alquímicos posteriores. É dito que Ahura Mazda usa do Vazio, sensível e infinito, como uma das armas contra Angra Mainyu, o jogando ao estupor do esquecimento e do caos. Nesse período, Ahura Mazda cria suas 7 Luzes e também Keyumars, humano nem homem nem mulher e com a qualidade de ser imortal – ou “o mortal que vive”.
Arimã destrói Keyumars, dando origem a uma Árvore e toda a vida vegetal da Terra, a partir de suas sementes diversas. Dos galhos bifurcados dessa Árvore, surgem Mashya e Mashyana, os primeiros homem e mulher separados, mas casados e prometidos a enfrentar as trevas absolutas. Seus descendentes poderiam acessar as virtudes da Luz ao permanecerem nos preceitos da retidão do caminho do bem. Então surge o Mazdaísmo, ou “Mazdayasna”, o sistema de crenças que configuram o zoroastrismo, como vimos na evolução dos povos no início desse texto. Sua premissa é a luta entra as forças da escuridão e da Luz. Após as invasões cristãs e árabes, o Fogo do Templo fora apagado, pois os zoroastrianos não tinham interesse político para manter sua regência com poder imperial. Algo semelhante aos gnósticos e essênios, os quais não se alocavam nos poderes sacerdotais de grandes templos.
A responsabilidade individual e as práticas do bem, são os conceitos que se firmaram nessa cultura antiga e influenciaram a mística de diversas tradições posteriores.
Texto por Michel Luiz.

Comments